Números e ações do Corinthians contrastam com declarações da diretoria; entenda
Nos últimos meses, as discussões sobre os problemas financeiros do Corinthians tomaram conta das conversas esportivas. Após o déficit de R$ 177 milhões registrado nas demonstrações de 2019, o clube vem sofrendo com atrasos de salários e processos movidos por ex-atletas.
No meio disso tudo, veio a pandemia de coronavírus, que ‘paralisou’ o mundo e desacelerou as economias dos quatro cantos do planeta. Porém, de acordo com o jornalista especializado em negócios do esporte, Rodrigo Capelo, “a culpa da tragédia financeira do Corinthians não é da pandemia”.
Em seu blog no GloboEsporte.com, Capelo publicou uma análise do atual momento financeiro do Corinthians. A Central do Timão estudou o texto e adicionou outras informações complementares para te ajudar a entender os problemas do clube; acompanhe.
A publicação de Capelo junto ao podcast ‘Dinheiro em Jogo’, também do GloboEsporte.com, analisaram a situação do Corinthians. Pelas demonstrações, é possível ver que o clube se apoia em algumas práticas vitoriosas no passado, mas que vêm mostrando-se ineficientes no atual contexto.
A primeira delas é a contratação de jogadores ‘mais baratos’. Por exemplo, ainda no início do primeiro mandato de Sanchez, em 2008, o Corinthians apostou em nomes como Elias, Douglas e Chicão. Na sequência, já no início da década passada, investiu em Paulinho e em Ralf, e, posteriormente, Romarinho. A estratégia deu certo na época, como explica o próprio diretor de futebol, Duílio Monteiro Alves.
“Já fizemos isso na primeira passagem, alguns jogadores deram muito certo no Corinthians, como Leandro Castán. Felipe, Paulinho e Romarinho. É o momento que o clube atravessa, a gente quer investir em um time que seja mais barato, que tenha um prazo maior de validade, para quatro, cinco anos. Temos buscado promessas por aí que venham com custo baixo, que tenham salário menor, como é o caso do Mateus Vital”, citou Duílio ao ‘Mesa Redonda’, da TV Gazeta, ainda em 2018.
Em 2018 e 2019, o clube investiu também neste tipo de estratégia. Assim, foram vários jogadores vindos de maneira ‘mais barata’, como Marllon, Roger, Jonathas, Sergio Díaz, Richard, Manoel, Jr. Urso, Régis e Matheus Matias. Muitos não deram resultado dentro de campo, e foram emprestados ou devolvidos em pouco tempo, contrariando a ideia de “prazo maior de validade” defendida por Duílio.
No ano de 2019, o Corinthians gastou cerca de R$ 223 milhões com salários, como demonstra o balanço financeiro do clube. O maior rival gastou cerca de R$ 263 milhões, também contando os direitos de imagem. O Flamengo superou os R$ 270 milhões. O Athletico Paranaense, campeão da Copa do Brasil e quinto colocado no Brasileirão 2019, apresentou uma folha de cerca de R$ 140 milhões.
Desse modo, a contratação de ‘apostas’ que não deram certo pode ser um problema para o clube. A folha salarial se infla de jogadores emprestados e não aproveitados pelo time principal, gerando gastos que podem não se converter em resultados esportivos.
De acordo com o balanço financeiro de 2019, o Corinthians aumentou a arrecadação comercial, conseguindo cerca de R$ 90 milhões com patrocínios. O clube ainda segue uma estratégia adotada em 2009. À época, para arcar com os custos de Ronaldo, o marketing dividiu o uniforme de jogo em várias partes.
A ação foi um marco no patrocínio esportivo brasileiro. Ao aproveitar omoplatas, axilas e partes inferiores, o Corinthians fechava contratos menores, mas arrecadava mais dinheiro na soma total. Nos últimos tempos, o clube enfrentou problemas de quebras de contrato e falta de pagamento dos valores acertados.
“[A empresa] honrou um ou dois meses. Está com o jurídico. Ele [o dono da Apollo] deu o passo errado, e isso trouxe consequências para nós. É um contrato que não foi cumprido. Tiramos a marca dele, e o espaço está livre. Estamos prontos para negociar com qualquer outro”, declarou Roberto de Andrade ainda em 2017, a respeito de uma marca que ‘sumiu’ e não pagou os valores do contrato.
Segundo o jornalista Rodrigo Capelo, o Corinthians, ao se associar a empresas com faturamentos menores, pode correr os riscos de não contar com a mesma segurança de mercado de uma gigante do segmento. Assim, fecha contratos mais simplórios e pode levar ‘calotes’.
Por mais que a somatória dos patrocínios tenha atingido valores altos, o patrocinador máster caiu consideravelmente. Pós-Libertadores de 2012, a Caixa Econômica Federal pagava algo próximo dos R$ 30 milhões anuais. Atualmente, o BMG acertou um contrato de R$ 12 milhões fixos mais bônus por abertura de contas no banco, o que não tem arrecadado altas quantias para o clube.
Na opinião do economista Cesar Grafietti, o déficit de R$ 177 milhões por si só, fora de contexto, não é um alarme tão grande. Segundo o profissional, os clubes e até mesmo grandes empresas conseguem operar com anos deficitários. Porém, os problemas principais do Corinthians aparecem ao se examinar mais a fundo o balanço de 2019.
Além da relação receitas x despesas, outra questão a ser observada é a relação entre endividamento e receitas. Em 2016, o clube teve uma arrecadação de R$ 416 milhões perante R$ 383 milhões acumulados em dívidas. A relação de um para um torna o balanço financeiro mais equilibrado.
Porém, em 2019, o quadro ficou bem mais instável. Enquanto arrecadou R$ 353 milhões (segundo as contas de Rodrigo Capelo e já retirando estádio e repasses de mecanismos da FIFA por jogadores), a dívida do clube atingiu R$ 665 milhões. A relação então chegou a 2 para 1, ou seja, as dívidas são quase o dobro da arrecadação. Veja o gráfico do GloboEsporte.
Em sua participação no ‘Jogo Aberto’ da última terça (16), o diretor de futebol Duílio Monteiro Alves assegurou que o clube tem novas fontes de renda, inclusive com a chegada de patrocinadores. Porém, segundo o gráfico, é preciso entrar muito dinheiro para equiparar a balança.
Segundo o balanço financeiro de 2019, o ‘Segmento Clube Social e Esportes Amadores’ do Corinthians arrecadou algo próximo de R$ 32 milhões de reais, entre contribuições de sócios e explorações comerciais, como patrocínios. O levantamento publicado por Rodrigo Capelo cita que os gastos com o mesmo setor chegaram a R$ 80 milhões em 2019.
Assim, desconsiderando valores de depreciação do patrimônio, que não altera o caixa, o clube teve um prejuízo acima de R$ 45 milhões com o clube social, algo adquirido e mantido há muito tempo, consideravelmente anterior à pandemia de coronavírus. Vale ressaltar que o balanço financeiro ainda traz R$ 15 milhões relativos a ‘rateio de despesas’ que foram desconsiderados na conta.
Os efeitos da pandemia serão sentidos nos próximos balanços financeiros do clube, principalmente relativos a 2020. Porém, enquanto dirigentes afirmam que “todo mundo vai sofrer” e que “o momento da economia é complicado”, o Corinthians apresenta dificuldades econômicas com origens anteriores ao início da pandemia de Covid-19.
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Por: Gabriel Gonçalves / Redação Central do Timão
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