Em meio ao impasse envolvendo o fornecimento de material esportivo ao Corinthians, com a atual diretoria procurando opções à Nike e flertando com a Adidas para substitui-la a partir de 2026, uma questão permanece em aberto, podendo render dores de cabeça ao clube em caso de rompimento com a empresa estadunidense.
O possível problema em vista tem relação com a elevada quantidade de itens recebidos da fornecedora durante o ano passado, cujo valor total supera em muito o estipulado por contrato. Ao todo, o Corinthians consumiu R$ 13,2 milhões em produtos da Nike durante 2024, mais que o triplo dos R$ 4 milhões relativos à “cota anual não cobrável” combinada com a empresa. Além disso, parte destes itens não foram devidamente regularizados, para fins fiscais, no ato do recebimento.
A informação foi veiculada primeiramente pelo UOL e confirmada pela Central do Timão, que teve acesso a trocas de e-mails entre departamentos do Corinthians e a EY, consultora do clube durante parte de 2024. Foi a então parceira do Alvinegro que relatou, em agosto, graves irregularidades na gestão de notas fiscais (NFs) de materiais esportivos fornecidos pela Nike.
Diversos dirigentes e membros da administração alvinegra receberam o e-mail da EY com este alerta, como Pedro Silveira, ex-diretor financeiro, Marcelo Mariano, ex-diretor administrativo, Vinicius Azevedo, ex-superintendente de marketing, Luiz Ricardo Alves, o “Seedorf”, gerente financeiro, Caio do Valle, consultor de negócios estratégicos, e Marcelo Munhoes, ex-chefe de TI, entre outros. Em e-mails subsequentes, até mesmo Marcelo Eduardo Rodrigues Sales, o “Ninja”, chefe de gabinete de Augusto Melo, é copiado com seu e-mail pessoal.
No e-mail, a EY discorre sobre a descentralização do estoque e a emissão de NFs em dois CNPJs — Parque São Jorge (PSJ) e Centro de Treinamento (CT) —, aprovada no início do ano, que gerou até aquele mês um rombo de R$ 3,5 milhões em notas não lançadas no sistema. A mudança, que teria sido motivada pela alta demanda do futebol masculino e atrasos da Nike, expôs o clube a multas fiscais, riscos de quebra contratual, reembolsos retroativos e danos à reputação, segundo a consultoria.
Ainda segundo o alerta da EY, a situação já se agravava desde abril, que foi quando quando o CT profissional passou a emitir as notas fiscais dos itens recebidos diretamente em seu CNPJ (61.902.722/0002-07), sem alinhamento com a Controladoria do Corinthians. Em julho, o Corinthians já havia consumido 28.027 itens, com valor equivalente a R$ 9,8 milhões. Para efeito de comparação, durante todo o ano de 2023 o clube utilizou 33.824 itens.
Visando “eficiência operacional”, então, a EY recomendou a centralização do estoque no Parque São Jorge, orientação negada pela equipe do CT, alegando “falhas logísticas” na distribuição dos materiais. Foi explicado, ainda, que a separação do envio dos materiais e emissão notas em dois CNPJs era uma determinação da gestão do clube, alinhada no início de 2024.
Em complemento ao e-mail da EY, um departamento interno do Corinthians levantou a necessidade de envolver formalmente os setores contábil e fiscal em mudanças processuais. Também ressaltou que a legislação tributária brasileira exige autorização prévia para alterações no faturamento, sob risco de autuações e processos, e que além disso a Nike também precisaria validar a política de emissão das notas no CNPJ do Parque São Jorge, mas com entrega dos itens direta no CT.
A situação poderia, em tese, ter se regularizado com a implementação do sistema Protheus (sistema de gestão empresarial desenvolvido pela TOTVS) no CT, algo que, em e-mail enviado em dezembro, o mesmo departamento confirmou que foi feito. No entanto, as diretrizes seguintes a essa implementação, como a emissão das notas pendentes, não foram cumpridas até agora, segundo a apuração do UOL.
Vale lembrar que a EY aponta, em seu relatório, que recebeu de departamentos do Corinthians a informação de que estas notas fiscais não lançadas e, portanto em situação fiscal irregular, estavam sendo emitidas e enviadas diretamente a Marcelo Mariano por e-mail, supostamente para regularização futura.
Outras medidas emergenciais cujo cumprimento era necessário incluíam inventariar o estoque do CT, ajustar saldos no Protheus e iniciar o ano de 2025 com dados corrigidos. Sem executar tais medidas, o clube seguia sujeito a penalidades do SPED (Sistema Público de Escrituração Digital da Receita Federal) pela falta de transparência fiscal, além de correr o risco de prejudicar as relações com a Nike e arranhar a imagem do Corinthians no mercado.
As pendências documentais sobre produtos recebidos pelo Corinthians, assim como o estouro da cota não-cobrável prevista no contrato com a Nike, foram alguns dos motivos apontados pelo Conselho de Orientação (CORI) para rejeitar as contas de 2024 do clube. Mesmo sem apresentar os documentos que comprovam a devida contabilização dos produtos recebidos, a diretoria enviou ao UOL nota onde diz que toda a situação está regular. Confira:
“O Sport Club Corinthians Paulista informa que o controle de estoque e a distribuição interna de materiais esportivos fornecidos pela Nike estão devidamente contabilizados e no Centro de Treinamento do futebol profissional, todas as notas e comprovações de pedidos feitos para a empresa estão registradas e sendo publicadas no sistema. Anteriormente, esse processo era feito de forma separada para que apenas o futebol tivesse esse controle.
O Clube reconhece que houve um atraso nos registros devido à realização manual dos processos, consequência de uma readequação no sistema de gestão. Para garantir mais agilidade e precisão nas operações, o Departamento de Tecnologia da Informação do Corinthians está conduzindo a automatização da integração com o sistema de contabilidade interno.
A medida tem como objetivo otimizar os processos internos, reforçando o compromisso do Corinthians com a transparência e a eficiência administrativa.”
Veja Mais:
Sub-18 do Corinthians vence mais uma e lidera o grupo da Paulista Cup
Com ausência de Martínez e foco no G6, Corinthians encerra preparação para duelo pelo Brasileirão
2019 @ Central do Timão - Todos os direitos reservados