Na tarde de sexta-feira, 25, o Corinthians publicou uma nota em seu site confirmando que a atual gestão do clube irá reabrir o balanço de 2023, a fim de oficializar a inclusão de supostas contingências no valor de R$ 191,3 milhões naquele exercício. Esse montante corresponde a cerca de um terço dos R$ 602 milhões relativos ao aumento da dívida registrado pela diretoria nas contas de 2024.
Segundo o texto, a decisão se baseia em parecer da auditoria externa realizada pela GF Brasil, empresa contratada pela atual gestão para substituir a RSM Brazil, responsável pela auditoria dos demonstrativos financeiros do Corinthians em 2023. O clube informa ainda que a medida foi “comunicada” ao Conselho Deliberativo (CD) e ao Conselho de Orientação (CORI), e que os documentos estarão disponíveis para as reuniões desses órgãos nesta segunda-feira, 28.
A nota foi publicada pelo clube poucas horas após uma sequência de eventos no Parque São Jorge, que incluiu a protocolização da ata da reunião do Conselho Fiscal (CF), que recomendou ao CORI a rejeição das contas de 2024 do Corinthians, um pedido da gestão ao CD para adiar a votação do próximo dia 28, e a recusa a esse pedido, expressa por meio de ofício do CD.
O que diz a GF Brasil
A Central do Timão confirmou junto à assessoria do presidente Augusto Melo que o parecer da auditoria ao qual a nota faz referência é o relatório presente no balanço de 2024 entregue pela gestão. Este relatório é assinado pelo auditor independente Ronaldo Antonio Bordini, representando a GF Brasil.
Sua opinião sobre os demonstrativos incluíam três bases para ressalvas, sendo a primeira delas exatamente as “contingências” que vêm sendo alvo de debate no clube há algumas semanas. O texto divide esses valores em dois, sendo R$ 106,24 milhões relativos a autos de infração e multas de ISS (Imposto Sobre Serviços) e encargos relacionados ao Profut.
Os outros R$ 85,056 milhões são classificados como provisões para contingências de naturezas cível, trabalhista, fiscal e tributária. Em outras palavras, referem-se a processos judiciais nos quais o clube tem mais chances de ser derrotado do que de vencer, o que obriga a previsão dessa possível ou provável despesa no balanço financeiro.
A auditoria, então, explica que o balanço “expurgou” (ou seja, excluiu) esses valores das suas contas, para “refletir” o que seria, na visão do clube, a visão mais correta sobre o seu desempenho financeiro em 2024. Diz, ainda, que os valores relativos aos encargos do Profut e as contingências com fatos geradores anteriores a 2024 (que somam R$ 56,233 milhões daquele total de R$ 85,056 milhões) devem ser retificados no balanço de 2023, conforme norma estabelecida no CPC 23.
CPC é a sigla para Comitê de Pronunciamentos Contábeis, órgão criado em 2005 pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC) para normatizar os atos da profissão. No CPC 23, publicado em 2009, o tema abordado foi políticas contábeis, mudanças de estimativas e retificação de erros. O documento estabelece em quais situações um balanço pode ser corrigido e orienta sobre a forma de ajuste, dependendo da natureza do erro identificado.
Recepção não é unânime
A decisão da atual gestão alvinegra de atribuir R$ 191,3 milhões em contingências às contas de 2023, já auditadas e aprovadas, tem gerado discussões desde o início do mês. O tema foi motivo de troca de notas entre a diretoria e o CORI, além de pronunciamentos do atual e do ex-diretor financeiro do clube, Pedro Silveira e Wesley Melo, que acusou a diretoria de tentar se eximir da responsabilidade pelo aumento do endividamento registrado no ano passado.
Além disso, o tema foi debatido em reunião entre representantes do clube e da diretoria dos Gaviões da Fiel, realizada na última terça-feira, 22. Em nota sobre o encontro, a torcida mencionou que uma das pautas foi a contabilização dos “R$ 191 milhões de dívidas de gestões passadas contabilizadas em 2024, mas que não necessariamente todas deveriam já estar contabilizadas em 2023”.
Por sua vez, o Conselho Fiscal abordou o tema em sua análise das contas, protocolada nesta sexta-feira no Conselho Deliberativo. O órgão concordou com o parecer da GF Brasil, segundo o qual apenas as contingências relativas ao Profut e às provisões com fato gerador ocorrido em 2023 justificariam a reabertura do balanço, caso sejam devidamente comprovadas.
Em relação às dívidas de ISS e às demais provisões, o Conselho Fiscal entendeu que se tratam de lançamentos contábeis referentes a 2024, devendo, portanto, constar no balanço deste exercício, e não ser atribuídos a 2023, como deseja a atual gestão. Essas duas contingências somam, ao todo, R$ 104,852 milhões.
Horas depois, o Conselho Fiscal emitiu um ofício no qual informou ter tomado ciência da decisão da diretoria de reabrir o balanço e declarou que aguardará os resultados. O órgão ressaltou que, dependendo das alterações realizadas, a retificação poderá impactar as contas de 2024 e modificar elementos do parecer já emitido sobre os demonstrativos.
O CORI também abordou a questão em ofício no qual rejeitou o pedido da diretoria para adiar a reunião marcada para esta segunda-feira, 28. Ao final do texto, o órgão afirmou: “…este órgão não encontrou no relatório da auditoria solicitação de reabertura das contas do exercício de 2023, conforme mencionado em vossa solicitação“.
Fontes ligadas ao Corinthians, ouvidas pela Central do Timão, estão divididas sobre o tema. Algumas consideram que a decisão da diretoria é suficiente para reabrir as contas, sendo necessário apenas comunicar os órgãos fiscais do clube. Por outro lado, há quem defenda que essa reabertura só poderia ocorrer se a auditoria atual notificasse a auditoria anterior, permitindo que as correções fossem realizadas a partir desse check-up. Ainda existem aqueles que acreditam que a reabertura só pode avançar com a anuência dos conselhos corinthianos, incluindo o Conselho Deliberativo, e não bastaria uma simples comunicação.
Possível conflito à vista
Caso realmente se concretize a reabertura do balanço de 2023, o Corinthians pode enfrentar um possível conflito com a RSM Brazil, empresa que auditou os demonstrativos financeiros do clube até 2023.
A Central do Timão apurou que, neste mês, a empresa foi contatada por um representante do clube, que solicitou documentos relacionados às classificações de riscos processuais elaboradas pela RSM para embasar a análise do balanço de 2023. Essas classificações determinam se um processo contra o Corinthians será considerado como tendo “alta chance de perder”, o que impacta o balanço, já que, nesses casos, é necessário incluir uma provisão equivalente ao valor da causa.
Ainda segundo a apuração, a empresa teria se negado a fornecer os documentos, exigindo um convite formal da gestão para prestar esclarecimentos, com os devidos registros. Ciente dos possíveis desdobramentos, a RSM teria revisado seus pareceres sobre as contas do Corinthians, não apenas de 2023, mas também dos anos anteriores, e não teria identificado falhas que exigissem correção.
Por fim, também foi apurado que a empresa estaria acompanhando os próximos passos da gestão corinthiana, disposta a contestar possíveis tentativas de correção ao seu trabalho que considere ilegítimas, sem descartar a possibilidade de recorrer à via judicial, caso julgue necessário.
Enquanto o tema não avança, a gestão se prepara para fornecer ao CORI e ao CD os últimos documentos sobre as contas de 2024, antes das reuniões previstas para esta segunda-feira. A tendência, no momento, é de reprovação do balanço, e, caso isso ocorra, a diretoria ficará sujeita a um processo de destituição, conforme prevê o artigo 106 do estatuto alvinegro.
Confira na íntegra a nota oficial do Corinthians sobre a reabertura das contas:
A auditoria externa da empresa GF Brasil Auditoria & Consultoria emitiu parecer fazendo apontamentos relativos ao balanço de 2023, no qual deixou-se de apresentar um valor de contingência tributária no importe de R$ 191 milhões.
Diante deste fato e atendendo a orientação técnica, o Presidente da Diretoria, Augusto Melo, solicitou a respectiva reabertura e republicação do balanço de 2023.
Tal medida se faz necessária para realizar o correto apontamento das pendências tributárias que existiam no ano de 2023 e que não foram devidamente contabilizadas.
Importante esclarecer que o Presidente da Diretoria comunicou ao Conselho Fiscal, ao CORI e ao Presidente do Conselho Deliberativo acerca da providência tomada, ressaltando que, para o bem do Sport Club Corinthians Paulista, a questão deveria ser pauta exclusivamente de forma técnica.
Na próxima segunda-feira (28), a gestão entregará ao Conselho Fiscal, Conselho de Orientação e Conselho Deliberativo todos os documentos contábeis para análise e conhecimento de todos.
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