Com ingresso e passagem comprados na véspera do jogo, Gilberto Pimentel, de Presidente Prudente, mostra que o que para tantos parece fácil, para outros, atos simples como ir ver seu time no estádio, viram correria. Mas valem a pena. Confira a odisseia dele em 2017
O futebol é mais que um esporte, disso ninguém tem dúvidas. E também atravessa fronteiras. Para ver seu time, vale tudo, até viajar mais de 500 quilômetros em cima da hora para ver de perto seu time ser campeão. Se já é dessa forma com o torcedor de outros times, no Corinthians vira superlativo.
Assim foi com Gilberto Gomes Pimentel, 50 anos, corinthiano, casado e com uma filha (Sofia, seis anos), que não poupou esforços ao saber que o Timão estava envolvido em mais uma decisão. Morador de Presidente Prudente, mais perto do Paraná e de Mato Grosso do Sul do que da capital paulista, sempre que pode (às vezes também quando não pode), vai matar saudade do Corinthians.
“Lembro até hoje a emoção, ainda estou invicto na Arena, vou desde 2014 Corinthians x Coritiba com empate do Timão no finalzinho, jogo de despedida do Alex. Fui com colegas em 2016 ver um jogo às 11h da manhã, saímos às 03h de Prudente, os ingressos mando entregar no apartamento de uma pessoa amiga, retiramos na portaria. Em 2015 fui à noite de sábado, em julho, segundo turno, jogo difícil que ganhamos do Galo por 1×0”, conta orgulhoso.
Corinthians x Fluminense teriam como palco a Casa do Povo. A “Quarta Força” chegava à 35ª rodada podendo ser campeã do Campeonato Brasileiro. Heptacampeã. A partida seria às 21:45h do dia 15 de novembro de 2017. Ingredientes para mexer com a paixão do torcedor corinthiano, não faltavam.
Na liderança com 68 pontos, a 10 do segundo colocado, Grêmio (58), o Timão precisava vencer o Fluminense para levantar a taça. Caso empatasse, a festa seria adiada, e se perdesse, a pressão aumentaria, já que tanto o time de Renato Gaúcho (que ainda esperava o Corinthians despencar), quanto o arquirrival Palmeiras (que secava como nunca), teriam chances matemáticas do título.
O técnico Fábio Carille não poderia contar com Balbuena, suspenso por cartão amarelo, e Pedro Henrique, inexperiente, seria o substituto. Cássio tinha acabado de chegar de Londres, onde estava com a Seleção, Walter lesionado, o menino Caíque seria o goleiro. A notícia boa era Jô, que retornava de suspensão, no lugar de Kazim.
Na 14ª colocação, com 43 pontos, o Fluminense ainda tinha chances de ser rebaixado, vinha com sangue nos olhos, incentivado pela torcida de todos os que não eram corinthianos. Com apenas uma vitória nos últimos cinco jogos, além de dois empates e duas derrotas, o time carioca desejava estragar a festa do título da Fiel, e contava com o retorno do “Ceifador” Henrique Dourado, artilheiro da Série A com 17 gols.
Gilberto é bancário e na época trabalhava das 13 às 22h. Ficou uns dias tentando comprar o ingresso pelo Fiel Torcedor e não conseguiu. Na terça (14), véspera do jogo, viu no Twitter que uma nova carga de ingressos seria disponibilizada às 20h. Colou no celular e no computador e conseguiu comprar na Oeste inferior. Mas… como ir? O jogo aconteceria em menos de 24 horas, no feriado de 15 de novembro, e ele ainda estava em Presidente Prudente, onde mora, a 550 km de distância até a capital.
Dono de umas milhas, tentou pela empresa aérea Gol. Saindo de Prudente utilizava muitas milhas e na volta ele chegaria atrasado no trabalho no outro dia (16). De ônibus poderia ir, porém não tinha horário na volta de madrugada.
Simulou o voo saindo de Londrina (PR). Encontrou um saindo às 19h e chegando às 20h em São Paulo (quase na hora do jogo!) com retorno na madrugada/manhã da quinta dia 16 às 06:20h. Voo comprado.
Não tinha contado nada para a esposa Patrícia e não sabia como falar. Mas, tranquilo, porque Patrícia conhece a paixão do marido e “só reclama na hora”.
Na quarta, feriado, uns parentes apareceram para passar o dia. Esperou contando os segundos no relógio e só quando foi tomar banho, às 15h, avisou.
“Recebi aquele “não acredito”! Falei que já estava comprado, me despedi das visitas. Londrina fica à 180 km de Presidente Prudente, peguei o carro e saí às 16h. Como era feriado, às 18h já estava no aeroporto, no Paraná”, lembra o torcedor.
“Já tinha feito o check in antes, emiti o bilhete de embarque e aguardei a chamada. O voo saiu no horário, como já morei em São Paulo Zona Leste (Cangaíba), por 30 anos, sei das condições do trânsito, mesmo em feriados.”
“Chegando em Congonhas, o que acontece sempre a fila de aviões para aterrissar atrasou o meu cronograma. Desci rápido, chamei um Uber até a estação do metrô Tatuapé. Cheguei no metrô, comprei bilhete ida e volta, e fui para a Arena.”
Gilberto chegou às 21:20h na estação Corinthians Itaquera e, o torcedor que conhece, sabe como precisa correr (na subida) para chegar à entrada do setor Oeste. O jogo começaria às 21:45h.
Ufa! Finalmente no estádio. Estava começando a tocar o Hino. Agora é achar seu lugar e descobrir que estava próximo a ninguém menos que Ronaldo Fenômeno, Gabriel Medina e seu conterrâneo Thiaguinho!
Bola rolando na Arena Corinthians. O Grêmio estava vencendo o São Paulo no Olímpico e chegava a 61 pontos. Sinal da cruz, ainda gritando os nomes dos jogadores e… gol do Fluminense. Henrique, não o Dourado, o zagueiro.
“Falei: só falta o time não render hoje!…”
O detalhe é que aquela era a 35ª rodada e o Corinthians não tinha vencido nenhuma partida de virada naquele Brasileiro.
“Não para de lutar!”, rebateu a Fiel, de imediato, no final da gritaria que sucedeu o gol do Fluminense. Primeiro tempo só o Corinthians jogou, mas pouco criou.
Gilberto lembra que foram 90 minutos de incentivo. No ritmo da torcida, que cantou alto logo na volta do segundo tempo, o Corinthians partiu para cima nos primeiros lances. Antes de dar um minuto, Jô recebeu fora da área e abriu para Clayson na esquerda. Calmo, o maior garçom do time no Brasileirão esperou o artilheiro se posicionar e serviu para um cabeceio perfeito. Era o empate.
Aos três minutos, uma jogada que parecia despretensiosa rendeu a virada do Timão. Um chutão de Caique foi desviado por Jô e a bola chegou até Clayson, que cruzou. Depois de bater no travessão, a sobra ficou com Jô, de novo de cabeça, para marcar.
Gilberto não viu, mas Caio Ribeiro dizia na televisão:
“Ninguém jogou mais bola neste campeonato do que o Jô. Quando a fase é boa, a bola procura.”
“Lembrei que o rapaz do assento ao lado tinha ido comprar lanche pra namorada e quando chegou já tínhamos virado, falamos “pode ficar lá mesmo”. No final, Jadson fez um lindo gol e começou a festa na arquibancada! A Quarta Força conseguiu! O Corinthians era heptacampeão Brasileiro!”, ainda comemora Gilberto.
“Esperei diminuir o volume no metrô, peguei o último metrô sentido linha norte sul, desci na estação Conceição e peguei um Uber pra Congonhas. Encontrei um hotel simples, cheguei quase a 1h da madrugada, tinha levado um camiseta, escova de dentes, meia e cueca reservas, tomei banho , fui dormir, acordei às 5h para tomar outro banho e pegar o voo de volta para Londrina. Cheguei em Londrina 07:30h, paguei o estacionamento do carro e às 10h estava em casa.”
“Tentei descansar um pouco, mas nem consegui dormir direito, adrenalina a mil, vendo as informações do jogo e o Twitter. Às 12h tomei um outro banho, almocei e fui trabalhar. À tarde o sono bateu, mas valeu a pena! Tudo é válido pelo Corinthians, o prazer de comemorar no estádio é indescritível”, conta.
Jô se tornou artilheiro do Brasileirão. Era a primeira vez que o Corinthians tinha um artilheiro no nacional. Jô, com 18 gols, empatado com Marcelinho Carioca, se tornou o terceiro jogador do Corinthians com mais gols numa edição de Campeonato Brasileiro. Atrás só de Luizão, que fez 21 em 1999, e Tevez, que marcou 20 em 2005.
Romero se tornou o estrangeiro com mais jogos pelo Corinthians, empatado com Rincón.
Jadson completava 150 jogos pelo Corinthians naquela noite.
Depois de 472 dias sem entrar em campo, Danilo entra, aplaudido de pé pela Fiel, e recebe a braçadeira de Capitão, para ser campeão pela sétima vez com a camisa do Timão. O meia não jogava desde 31 de julho do ano anterior. Aos 38 anos se tornou o jogador mais velho a ganhar um título pelo Corinthians.
Arana confirmava a proposta do Sevilla e se despedia do Timão.
Foi a primeira vez que o Corinthians virou um jogo naquele Brasileirão, e na 35ª rodada.
A Quarta Força conquistou o Heptacampeonato Brasileiro calando a boca de toda a mídia que passou o ano menosprezando o time.
Ao assegurar mais uma taça do Brasileirão, o Corinthians conquistou também a hegemonia no século 21. Desde 2001, o clube alvinegro soma quatro títulos: 2005, 2011, 2015 e 2017.
CORINTHIANS 3 X 1 FLUMINENSE
Local: Arena Corinthians, em São Paulo (SP)
Data: 15 de novembro de 2017, quarta-feira
Horário: 21h45 (de Brasília)
Árbitro: Bráulio da Silva Machado (SC)
Assistentes: Kléber Lucio Gil e Neuza Ines Back (ambos de SC)
Público: 46.189, sendo 45.775 pagantes
Renda: R$ 2.882.688,00
Cartões amarelos: Gabriel (Corinthians); Léo, Henrique Dourado, Reginaldo, Pedro, Henrique e Lucas (Fluminense)
Gols:
CORINTHIANS: Jô, a 1 e aos 4 minutos, e Jadson, aos 40 minutos do segundo tempo
FLUMINENSE: Henrique, a 1 minuto do primeiro tempo
CORINTHIANS: Caíque; Fagner, Pedro Henrique, Pablo e Guilherme Arana; Gabriel, Camacho (Jadson), Romero, Rodriguinho e Clayson (Maycon); Jô (Danilo)
Técnico: Fábio Carille
Por Nágela Gaia/ Redação da Central do Timão
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