Em 1928 o Corinthians se mudou da Ponte Grande para o Parque São Jorge. Dentre tantas famílias que nasceram e criaram seus filhos em volta da “Fazendinha”, conversamos com um bisneto de Antônia de Soledad, que foi uma das primeiras lavadeiras dos uniformes do Timão nos anos 30
O saudoso corinthianíssimo Antoninho de Almeida já dizia: “Tudo dentro do Corinthians tem sua história. É uma história natural, como natural foi a própria fundação do clube.” E todas as histórias ligadas ao Corinthians merecem ser contadas, pois, são histórias de amor.
Não é exagero dizer que o Corinthians mudou a perspectiva de vida dos habitantes do loteamento Parque São Jorge. Um bairro construído em terras que pertenciam a Assad Abdalla e Nagib Salem, cujas ruas foram entregues e abertas ao trânsito público no último dia do ano de 1917. Todas as ruas do Parque tem nomes de santos católicos.
O bairro chegara aos onze anos de idade em 1928, quando o Corinthians se mudou do Estádio da Ponte Grande para a “Fazendinha”. Muitas famílias de operários também chegavam ao local, atraídos pela proximidade com as fábricas e tecelagens que começavam a surgir nas redondezas.
Tivemos acesso à história de mais uma dessas famílias que se criou em torno do Parque São Jorge, não o bairro, mas o Parque do Corinthians. Que não era chamado de Parque São Jorge. Era simplesmente “o Corinthians”, ou “a Fazendinha”.
“Tanto meus avós maternos, como os paternos eram corinthianos. O meu avô paterno era espanhol (Antônio Luque) e veio para o Brasil na época da segunda guerra mundial, virou corinthiano fanático, e é claro, contagiou o meu pai (Gildo Luque Jaime). Eu cresci ouvindo as histórias do meu pai, de que ia para Santos de trem assistir aos jogos do Timão, as escalações, e outras curiosidades. Eu sou sócio do Corinthians há 42 anos“, conta Gildo de Souza Luque, 55 anos, engenheiro eletricista, casado, pai de um casal de filhos. Todos corinthianos.
Gildo explica que muito dessa rica história se perdeu no tempo, pois a maioria dos que a viveram, já faleceram. Mas, buscou na memória um pouco para contar aos leitores da Central do Timão. Anos antes de seu avô paterno, espanhol, chegar a São Paulo, sua família pelo lado materno já vivia e criava seus filhos no Parque São Jorge.
“A família morou inicialmente na Rua Santa Maria, depois na Rua Santa Catarina e depois na Rua São Felipe, mas nunca se afastou do Parque São Jorge. O meu avô conheceu a minha avó quando as duas famílias moraram na Rua Santa Maria. Ele tocava violino e fazia serenata para ela.”
“Ainda há uma ligação maior através da família da minha mãe.” Maior e mais antiga.
Gildo fala orgulhoso das raízes do seu Corinthianismo. O outro lado de sua família, por parte de mãe (da avó, da bisavó), foi criado na Rua Santa Maria no Parque São Jorge, perto do Corinthians. O primo Valdir Fernandes praticou remo no Corinthians entre 1969/70 e chegou a treinar no barco-escola que ficava no Rio Tietê.
Nadadores, remadores, competidores vitoriosos e recordistas. Em 1933, o presidente Alfredo Schürig implantou o remo no Sport Club Corinthians Paulista. Foi quando o distintivo do clube recebeu o acréscimo do par de remos e a âncora como aparecem até os dias de hoje. A aquisição de 10 barcos de classe, usados do Clube Espéria, deu início a uma brilhante campanha de vitórias e conquistas. Na década de 70 o Corinthians foi um dos maiores no Remo.
Com uma história importante nesses cem anos, o Remo do Corinthians é o único que continua às margens do Rio Tietê e que permanece até hoje com seu departamento bem ativo. O Corinthians nunca abandonou o Rio Tietê. Mas isso já é outra história.
Para ajudar nas despesas de casa, Dona Antônia de Soledad vendia verduras pelas ruas do Parque São Jorge. Mas, como o dinheiro não era suficiente, contando com a ajuda da filha Margarida, lavava e passava os uniformes do Corinthians.
“Nos anos 30, a minha avó materna (Margarida Conceição Figueiredo) ainda jovem, ajudava a minha bisavó (Antônia de Soledad) a vender verduras pelas ruas do Parque São Jorge, transportando as verduras em um carrinho de mão”, conta Gildo.
Antes de se mudar para o Parque São Jorge, não haviam lavadeiras para os uniformes. Vemos, na história, depoimentos de diversos jogadores que contaram que cada um cuidava dos seus uniformes, levavam para lavar em casa. Já a partir de 1930, Dona Antônia de Soledad e sua filha Margarida (bisavó e avó de Gildo), iam, após os jogos, buscar os uniformes em trouxas e traziam para lavar em casa e deixavam “alvinhas” as camisas do Timão.
Temos que lembrar que naquela época não havia sabão em pó, alvejante, água encanada, amaciante, nem máquina de lavar. Os uniformes eram lavados em grandes tanques na residência delas. A água vinha do poço que havia no quintal. Sim, porque a água da fonte São Jorge, que caía abundante nos fundos do clube, e se transformou na famosa “biquinha”, era somente para beber e cozinhar.
O sabão provavelmente também era feito por elas e clareavam as roupas esfregando com suas mãos, batendo em tábuas e quarando em cima de pedras ao sol.
Até 1929 o Corinthians usava o tecido de algodão para fazer seus uniformes. A camisa que ficava completamente encharcada ao final dos jogos, pesava e desgastava muito os jogadores. Como podemos ver no artigo “O símbolo de glória da Fiel tem a sua história”, de Antoninho de Almeida, o linho todo branco já é citado como tecido das camisas. O linho era mais leve que o algodão, e mais durável. Porém, custava caro e quando molhado, também pesava.
Note-se na camisa usada por Zuza, o tecido encorpado, a gola alta, botões. Eram essas camisas de linho que dona Antônia de Soledad lavava e engomava. Cabe destacar, que Zuza é, até os dias atuais, o jogador do Corinthians que mais fez gols em uma única partida. Foram seis, contra o Sírio, em 21 de maio de 1933, a partida terminou em 10 x 1 para o Timão.
A partir de 1934 podemos observar pelas fotos históricas das equipes, o Corinthians abandonou a camisa de linho, dando lugar à malha de algodão, mais leve ainda que o linho. A camisa perdeu as golas, os botões e as mangas 3/4, passando a utilizar as mangas curtas. A versão de mangas compridas era para dias mais frios. Mas não existiam os tecidos cheios de tecnologia que temos atualmente.
Após lavar, era hora de encher os varais com as peças alvinegras. Peças que depois seriam engomadas. Não havia ferro elétrico. No Brasil, os primeiros ferros de passar foram importados apenas por ricos nos anos 40 e sua nacionalização ocorreu somente nos anos 50. Dona Antônia de Soledad e Margarida passavam todos os uniformes com ferro à brasa.
Mas também se divertiam. Iam aos jogos do time e dançavam carnaval em uma pequena sala do clube. Na foto abaixo, dona Margarida (a avó de Gildo) com suas irmãs mais novas, em foto tirada no clube do Parque São Jorge.
“O meu tio-avô David Assunção Figueiredo. Uma tia acha que, apesar da foto com uniforme do Corinthians, ele não jogou, a outra tia acha que jogou. Eu acho que não jogou, pois nunca fiquei sabendo e não existem registros. Ele era muito amigo dos jogadores, jogava mas não profissionalmente. Morava no Parque São Jorge (bairro), era irmão da minha avó, filho da bisa Soledad”, explica Gildo. Em todas as pesquisas que fizemos, não encontramos o nome de David. Mas pode ter pertencido ao time de Aspirantes.
“As pessoas iam buscar água na biquinha, que fica atrás do estádio, e ao lado da biquinha havia uma espécie de “lago”, que elas chamavam de “cocho”, a água era do Rio Tietê, e as pessoas da região se banhavam. O meu tio (Antônio Aristides Fernandes), foi conselheiro nos anos 70, por quatro anos… O meu primo também treinava na Represa do Guarapiranga pelo Corinthians… E eu morei durante 16 anos na Rua São Jorge, em frente ao Clube. Os meus filhos tiveram a infância no Clube”, finaliza Gildo Luque.
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Por Nágela Gaia / Redação da Central do Timão
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